Já vimos aqui nesse nosso espaço, ou nas dezenas de matérias que o JP faz, sobre os requisitos para a caracterização do vínculo de emprego, não basta somente prestar serviços, para ser considerado empregado, com todos os direitos advindos dessa nomenclatura, em tese precisa ser caracterizado os requisitos seguintes: habitualidade, pessoalidade, onerosidade, não eventualidade, e subordinação.
E assim, sendo preenchido os requisitos supra, há de fato o vínculo empregatício, garantindo assim que seus direitos trabalhistas sejam respeitados.
Porém há alguns anos uma discussão sobre o vínculo entre entidades religiosas e seus trabalhadores, e é isso que respeitosamente quero trazer essa semana.
Há quem entenda que o exercício de funções como padre, bispo, pastor, ancião, sacerdote, são respostas de um chamado espiritual, ou seja são atividades que transcendem questões pecuniárias, que não são treináveis, e sim, um dom, sendo o obreiro um escolhido para disseminar a fé, em suas mais abrangentes vertentes.
Ainda existe uma corrente que defende que tais funções devem ser consideradas como um serviço voluntário, contudo, deve esclarecer que em sua maioria os pastores, padres, e correlatos as funções religiosas recebem mensalmente um valor, ou seja, não se trata de trabalho voluntário em casos que há pagamento em contraprestação ao serviço prestado.
Então vamos pensar juntos, utilizando como exemplo as funções de um pastor, se ele tem seu compromisso com a igreja em estar presente em determinados dias da semana, se não pode ser substituído, ou seja, a atividade por ele desenvolvida (no caso o culto/ reuniões/ células) é pessoal, se ele for pago por essa atividade , e responde de forma subordinada ao pastor chefe, ou a uma igreja matriz / sede, por que mesmo cumprindo todos os requisitos explícitos na CLT esse profissional não pode ter seus direitos trabalhistas reconhecidos?
Pois bem, queridos, durante muitos anos, não houve uma decisão unanime, há decisões favoráveis reconhecendo o vínculo empregatício desses trabalhadores, e o contrário também é uma constante. Lembro especificamente de uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho que reconheceu o vínculo empregatício, e em uma das alegações era que o pastor tinha metas de arrecadação.
Assim, com o intuito de regulamentar de uma vez por todas, e assim, evitar decisões dissonantes, houve a aprovação da Lei 14.647/2023, que via de regra, não há existência de vínculo empregatício entre entidades religiosas, havendo exceção em caso de desvirtuamento da finalidade religiosa e voluntária.
Não nos cabe juízo de valores aqui, não deve ser questionada a fé, ou o dom, mas quero deixar um relato fático, que podemos comprovar na maioria das igrejas, se o obreiro recebe valor fixo mensal, tem horários fixos pré-determinados, recebe ordens de uma central, e tem metas a serem cumpridas, tal trabalho pode ser considerado voluntário, relação transcendental ou a uma relação trabalhista convencional?
Deixo essa reflexão, e adianto que sou favorável ao julgamento de forma individual, quando a fé passa a ser mercantilizada deve ser reconsiderado o posicionamento estritamente do cunho vocacional.